Odontogeriatria: Aspectos Fisiológicos, Farmacológicos e Psico-Sociais na Reabilitação Bucal do Idoso

  Artigo, 24 de Out de 2010

Resumo

O número de idosos vem expandindo aceleradamente devido à elevação do padrão de vida e dos avanços da ciência. Surgindo em 2001 no Brasil, a nova especialidade da odontologia, a odontogeriatra, estuda os fenômenos do envelhecimento que tem repercussão na cavidade oral e estruturas associadas. O cirurgião-dentista deve atentar para as particularidades dessa faixa etária, assim como a necessidade da troca de informações entre as demais especialidades da saúde que tratam do paciente, para a realização de um procedimento odontológico holístico, seguro e confortável. Imerso nesta lógica, este trabalho propõe, através de uma revisão de literatura, expor informações sobre os aspectos psicológicos, preventivos, fisiológicos e terapêuticos importantes no tratamento da saúde bucal do paciente senil.

Palavras-chave:  Odontogeriatria; Idoso; Cavidade Oral.

A população de idosos mundial vem aumentando absurdamente, esse fato é resultado da melhora das condições de vida e do acesso aos avanços da Medicina. Estima-se que teremos cerca de 22 milhões de idosos no Brasil no ano de 2020, o que significará cerca de 10% da população total. E que um quarto da população mundial será de idosos. (FIAMINGHI, 2004)

A expectativa de vida do brasileiro, que em 2004 era de 70,4, deve atingir o patamar de 81,3 anos em 2050, de acordo com o IBGE. Como conseqüência, a cada dia um maior número de idosos, com 60 anos ou mais (OMS), se preocupa com os cuidados com a saúde e a estética. Neste aspecto está envolvida a classe odontológica que, aprimorando seus conhecimentos e desenvolvendo novos materiais, atende este público cada vez mais preocupado com a sua aparência e seu bem-estar. (VALLE-COROTTI, 2004)

Então a Odontogeriatria é um ramo da Odontologia em grande expansão, que visa o atendimento da saúde bucal de forma preventiva e curativa de pacientes com doenças ou condições de caráter sistêmico e crônico, associadas a problemas fisiológicos,

físicos ou psicológicos. A Odontogeriatria surgiu como especialidade somente em 2001, aprovada na II Assembléia Nacional das Especialidades Odontológicas (ANEO). (VALLE-COROTTI, 2004; MELO, 2007; SOUZA, 2003)

A Odontogeriatria é importante no contexto social, pois proporciona uma maior atenção e adequação do cirurgião dentista ao idoso, população senil que vem crescendo no Brasil. Além de buscar a saúde e conseqüentemente uma maior qualidade de vida.

Neste trabalho apresentamos métodos preventivos, visando diminuir ao máximo o numero de procedimentos invasivos, de modo a melhorar a saúde bucal do idoso, o que o faz progredir no tratamento odontológico. Traçamos aspectos importantes da terapia medicamentosa geriátrica, pois devido às alterações fisiológicas, sistêmicas, e bucais o paciente geriátrico requer cuidados adequados. Além dos aspectos psicológicos, onde se tem como motivos para a problemática emocional do paciente, o medo e a ansiedade, que levam, ao idoso, mitos gerados em suas épocas em relação à imagem do cirurgião dentista, é de grande valia explorar a base do tratamento odontológico do paciente: os seus pensamentos e sentimentos.

OBJETIVO

O objetivo deste trabalho é apresentar a comunidade cientifica a importância da Odontogeriatria e abordar seus principais aspectos: psicológicos, preventivos, fisiológicos e terapêuticos.

REVISÃO DE LITERATURA

A pessoa idosa é uma complexa combinação e expressão de sua predisposição genética individual, estilo de vida e ambiente, os quais podem influenciar nas suas crenças e, conseqüentemente, seu comportamento em relação à saúde (FIAMINGHI, 2004 apud ETTINGER, 1999).

O envelhecimento é um processo dinâmico e progressivo, no qual há modificações morfológicas, bioquímicas, fisiológicas e psicológicas, que determinam a perda progressiva da capacidade de adaptação do indivíduo ao meio ambiente, ocasionando maior vulnerabilidade e maior incidência de processos patológicos, que terminem por levá-lo à morte. Com o processo de envelhecimento, a cavidade oral do idoso, como o restante do corpo, também sofre alterações como na secreção salivar, da mudança da microbiota oral, da descamação do epitélio oral e da produção de saburra lingual (placa bacteriana que recobre a língua). (SOUZA, 2003 apud PAPALÉO et al., 2002)

O cirurgião dentista que atende idosos deve estar atento as alterações bucais e sistêmicas de interesse odontológico, decorrentes do uso concomitante de drogas usadas para enfermidades corriqueiras entre os idosos.

Devido às alterações fisiológicas decorrentes do processo de envelhecimento, como: diminuição do número de células existentes no organismo, produção mais lenta de proteínas, queda da imunidade (o que favorece o aparecimento de infecções e tumores), tendência ao aumento ou à diminuição de determinados hormônios que podem provocar hipertensão arterial, diabetes, alterações do sono, artrite, doenças cardíacas, entre outras alterações (PEREIRA, 2002), afetam também a distribuição, biotransformação, excreção e seqüestros dos medicamentos. (MELLO, 2005). Deste modo, é importante que o cirurgião-dentista que vá se dedicar a esta área tenha bom conhecimento de farmacologia e terapêutica (para conhecer os possíveis efeitos adversos e interações medicamentosas), bem como esteja atento para avaliar de modo correto quais são os medicamentos que o paciente utiliza, para gerenciar adequadamente o tratamento.

Conhecer o paciente geriátrico como um todo e não somente sua boca é de extrema importância para o cirurgião-dentista que se propõe a atender indivíduos desta faixa etária. Noções de fisiopatologia, das condições crônicas que acometem esses pacientes e da farmacologia das drogas utilizadas são úteis ao profissional do futuro (PINELLI et al., 2005), uma vez que o número de idosos vem crescendo em todo o mundo, acarretando um aumento na demanda odontológica dessa parcela da população. (BERNSTEIN, 1989; IBGE, 2000; CASTRO, 2009).

As alterações na farmacocinética e farmacodinâmica das drogas em indivíduos idosos são um dos importantes determinantes do aumento da incidência de efeitos adversos e de interações medicamentosas nesses pacientes. Essas alterações decorrem de modificações ligadas ao processo de envelhecimento (RUMI, 2000).

O profissional deve discutir com os demais membros da equipe de saúde a possibilidade de administração de novos fármacos, quando necessário, e a modificação da atual terapia medicamentosa com o intuito de diminuir os efeitos colaterais bucais indesejáveis para realizar um tratamento odontológico com sucesso em idosos.

O cirurgião-dentista tem a responsabilidade de compreender os pacientes idosos e não ser um profissional levado pelos estereótipos socioeconômicos e culturais (SEGER, 1990).

Essa faixa etária de pacientes pode tornar-se vítima do pensamento velho dos cirurgiões-dentistas. Isso pode influenciar nas suas opiniões em relação ao tratamento e criar uma barreira para que os pacientes recebam o tratamento de qualidade que merecem. (FIAMINGHI, 2004)

A abordagem deve respeitar as características individuais de cada ser, não generalizando conceitos e procedimentos. Assim, evita-se a criação de rótulos que podem modular o atendimento oferecido a esses pacientes. (FIAMINGHI, 2004)

O cuidado aos idosos deve ser diferenciado, realizado por uma equipe formada por vários profissionais que compreendam as características peculiares da saúde do idoso e a presença de múltiplas enfermidades que determinam limitações funcionais e psicossociais. (DORÁZIO, 2008)

“A ansiedade pode ser conceituada como um fenômeno caracterizado por sentimentos de tensão, apreensão, nervosismo e preocupação. Esses sentimentos são subjetivos e, geralmente, ocorrem em resposta a alguma ameaça, sendo que a diferença entre medo e ansiedade parece ser somente de intensidade. O sentimento de ansiedade ou medo que ocorre em relação ao tratamento odontológico pode ser chamado de ansiedade odontológica, variando de intensidade de um paciente para outro ou até no mesmo paciente em função do tipo de procedimento. A ansiedade odontológica pode atingir níveis extremos, a ponto de interferir no próprio tratamento, influenciando-o negativamente, tanto na satisfação do paciente com o resultado final bem como na atuação clínica do profissional. ’’ (PETRY, 2006)

O idoso frente à intervenção pode sentir estes sentimentos que como foram citados interferem em grande demasia no tratamento odontológico e em suas atividades sociais, pois com a “má vontade” do paciente os procedimentos adequados podem não ser feitos trazendo prejuízos ao mesmo.

Vários fatores criam a ansiedade no paciente, entre eles: a visão do dentista que traz a dor, muito comum principalmente entre as pessoas mais velhas, onde precocemente em suas vidas foram submetidas a tratamentos curativos, logo dolorosos para os mesmos, a barulho da broca extremamente irritante para muitas pessoas, o ambiente do consultório, como seu cheiro, instrumentos, entre outros fatores.

Um dos modos de se evitar tais transtornos psicológicos é a prevenção que tem como objetivo principal a promoção da saúde alem de uma melhor qualidade de vida. E deve ser priorizada pelo odontogeriatra assim como o cirurgião dentista em vez de tratamentos imediatos e restauradores. Muito mais do que apenas indicar medidas preventivas, é preciso adequá-los às reais capacidades físicas (habilidade motora) e cognitivas (de compreensão dos propósitos preventivos) do paciente e do seu grupo de apoio (familiares e/ou enfermeira). (MELO, 2007)

A escovação é o principal método de prevenção, pois retira mecanicamente a placa bacteriana, assim evitando a proliferação da cárie e o desenvolvimento da doença periodontal. As escovas devem ser de cerdas macias, pequenas e ter perfil plano, acompanhada de fio dental, e de dentifrícios contendo fluoreto. A utilização de escovas interdentais e unitufos deve ser recomendada para aqueles idosos que possam colaborar, e nos casos de pacientes muito idosos ou acamados recomenda-se a utilização de gaze molhada em solução contendo água e peróxido de hidrogênio (água oxigenada 10 volumes). As soluções anti-sépticas devem ser sem álcool por causa do gosto e para evitar a desidratação da mucosa. (MELO, 2007)

Pelo grande numero de idosos que usam próteses totais ou parciais, é importante a limpeza desses aparelhos para evitar acumulo da placa bacteriana. Essa limpeza deve ser feita após as refeições com escovas dentais mais duras ou escovinhas para unhas com água e sabão. A prótese deve permanecer, durante a noite, submersa em água com algumas gotas de anti-séptico bucal. No caso de prótese fixa, a limpeza deve ser feita com escovas interdentais ou passadores de fio dental. (MELO, 2007)

A escovação da língua é outro método importante, pois retira a saburra lingual, que é uma mistura de restos de alimento, células mortas descamadas e bactérias, e é a principal causadora da halitose. O limpador de língua é a maneira mais eficaz de limpar ate o fundo da língua (o que não é possível com a escova dental) e deve ser utilizado apenas uma vez por dia. (MELO, 2007)

CONCLUSÃO

Sendo o envelhecimento uma fase tão importante da vida de um indivíduo, devemos compreender que o idoso tem particularidades especificas diferentes de qualquer outra faixa etária, buscando sempre um maior contato com as especialidades que cuidam da saúde, evidenciando os valores da manutenção da integridade funcional do sistema mastigatório para uma vida melhor e mais saudável na terceira idade. O idoso como ser participativo na sociedade deve ter sua devida importância.  Seus aspectos psicológicos, sociais e odontológicos precisam ser levados em conta pelo odontogeriatra que proporciona a saúde do paciente fundamentada nestes aspectos referidos anteriormente. É imprescindível o aprimoramento do cirurgião-dentista na Odontogeriatria para melhor connhecimento do  individuo idoso nesses tempos de alta expectativa de vida e maior esclarecimento sobre políticas preventivas, causando o retraimento da política curativa.

Referências Bibliográficas

•Fiaminghi DL, Dummel J, Padilha DMP, Dal Moro RG. Odontogeriatria: Importância da autoestima na qualidade de vida do idoso: Relato de caso. Rev. de Clín. Pesq. Odontol., v.1, n.2, out./dez. 2004 •Valle-Corotti KM, Valle CVM, Neves LS, Henriques JFC, Pinzan A. A Ortodontia na atuação odontogeriátrica. Rev Dental Press Ortodon Ortop Facial. Maringá, v. 13, n. 2, p. 84-93, mar./abr. 2008 •Souza MR, Genestra M. A Terceira idade na região sul fluminense do Estado do Rio de Janeiro e a importância da inclusão da odontogeriatria no currículo odontológico. Odontologia. Clín.-Científ., Recife, 2 (3): 217-224, set/dez., 2003 •De Castro AM, Rios RR, Montenegro FLB, Marchini L. Uso de medicamentos em idosos que procuram tratamento especializado em odontogeriatria. [Disponível em] URL: http://www.odontologia.com.br/artigos.asp?id=834&ler=s&idesp=19 [Acessado em]: 15/09/2009. •Petry PC, Toassi RMC, Scotá ACP, Fochesatto S. Ansiedade do Paciente Idoso Frente ao Tratamento Odontológico. RGO, P. Alegre, v. 54, n. 2, p.191-194, abr./jun. 2006 •Montenegro FLB, Brunetti RF. Um pouco sobre a Odontogeriatria e sua participação na melhora da qualidade de vida dos idosos. [Disponível em] URL: http://dr.odo.br/odontogeriatria-artigos/44-um-pouco-sobre-a-odontogeriatria-e-sua-participacao-na-melhora-da-qualidade-de-vida-dos-idosos.pdf [Acessado em] 18/09/2009. •Dorázio TOR, Montenegro FLB. Envelhecimento saudável e medicamentos: um alerta. [Disponível em] URL: http://www.odontologia.com.br/artigos.asp?id=790&amp [Acessado em]: 18/09/2009. •Silva EMM, Silva Filho CE, Fajardo RS, Fernandes AUR, Marchiori AV. Mudanças fisiológicas e psicológicas na velhice relevantes no tratamento odontológico. Revista Ciência em Extensão v.2 n.1, 2005 [Disponível em] URL: http://www.unesp.br/proex/revista/artigos_pdf/revistace_v2n1_revisao24.pdf [Acessado em]: 18/09/2009 •Mello HSA. Introdução; Terapia Medicamentosa; Prevenção em Odontogeriatria. In: Mello HSA. Odontogeriatria. São Paulo: Ed. Santos, 2005. P: xxi-xxv, 1-3, 37-48, 95-106. • Brunetti RF, Montenegro FLB. Introdução. In: Odontogeriatria: Noções de Interesse  Clínico. São Paulo: Ed. Artes Médicas, 2002. P: 29-30.

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Autora

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Dra. Priscila Neves

Cirurgiã-Dentista

 São Paulo, SP

Cirurgiã dentista formada pela Universidade Federal do Pará, pós graduada em Odontologia hospitalar pelo Instituto de Ensino e Pesquisa Albert Einstein e em Cirurgia Oral Menor... Leia mais

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